2006/10/20

 

TRADIÇÕES II

Esta é uma época que nos deixa gratas recordações. Vêm-nos à memória recordações, e com alguma saudade... Não, não é nostalgia. São saudades da vida simples d'outrora, da maior proximidade entre familiares e amigos. Nesta altura todos nós crianças, ansiávamos pela chegada do dia de todos os santos. A manhã do dia 1 de Novembro era sempre longa. Queríamos ir pedir os bolinhos. A ansiedade fazia perdurar o tempo mas , enfim lá chegava a hora de almoço, e depois a partida e o tão desejado “pedir os bolinhos”. «Normalmente em grupo, irmãos , vizinhos e amigos lá partíamos, percorrendo durante a tarde os lugares possíveis, batendo ao maior número de portas, e sempre com a mesma lengalenga: “o sr. dá-nos os bolinhos, em louvor de todos os santinhos?” E lá aparamos a talega, que há muito foi substituída pelo saco de plástico e agora se transformou em peça de museu. E tudo lá cabe: fruta, rebuçados… então isso era um troféu! E então se fosse uma moeda?… Chega rápido o fim do dia e é preciso regressar a casa com luz. Somos crianças e temos o aviso bem presente. Agora em casa, o ritual do despejar das talegas é suigénere. São os tremoços, as castanhas, as maçãs, as romãs… como que por magia, de tudo se tira da talega mágica. E é ver o que tem algo que por mero acaso não tenha calhado a outro. Mais um troféu a exibir. Os mais velhos, esses preparam já o magusto que irá reunir a família à volta das castanhas e da água pé em amena cavaqueira, contando histórias doutros tempos. Com as mãos mal lavadas da cinza que assou as castanhas, a família segue em grupo para a última acção deste dia, e isto já noite cerrada. A visita ao cemitério e colocação de velas nas campas dos seus ente queridos é um ritual feito por todos, novos e velhos. E é ver os mais novos como que incumbidos da obrigação, a reacender tudo o que são velas apagadas. Nesta noite ninguém pode ficar na escuridão! E este é um sentimento intrínseco de cada um. Se há um coval que não tem vela, então tiramos uma dos que têm mais e assim, mais uma alma fica alumiada. Se não é correcta a acção, o sentimento que a motiva esse é sim, muito nobre. Passar junto à igreja já noite dentro e ouvir os sinos repicar a finados com tal vigor que fazem arrepiar, é um desejo. Por isso o cemitério velho fica sempre para último. Agora é regressar a casa e dormir o sono dos justos. Amanhã logo pela manhã iremos à missa de finados e mais uma visita ao cemitério». É com saudade que recordamos esta tradição que nalguns aspectos se vai perdendo. Os magustos de família quase se não fazem, as crianças já não pedem os bolinhos, salvo raras excepções. Os sinos da igreja, agora movidos por sistema eléctrico, estão quase sempre mudos e quando tocam é em acordes que nos fazem aumentar a saudade doutros tempos. As visitas ao cemitério são feitas essencialmente durante o dia, deixando-se já as modernas “velas” acesas e à noite pouca gente, ou quase ninguém, se vê no cemitério. Consequências da evolução, da modernidade, das transformações que a vida tem sofrido. Cremos no entanto que o sentir das nossas gentes continua a ser o mesmo, e é isso que nos faz sentir saudade e lembrar aqui a tradição do dia de todos os santos, em Maçãs de Dª. Maria.

Comments:
A tradição já não é o que era, como se diz. Gostei, mas gostei mesmo deste relato, e a juventude que tendo navega pela net vai lendo isto, certamente ficará mais rica de informação sobre aquilo que já não encontra hoje.
Continue.
um abraço
 
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